24 julho 2011

O IMPÉRIO DO SENHOR MURDOCH

Daniel Oliveira (www.expresso.pt)
O império do senhor Murdoch chafurdou, durante anos, na imundice, transformando o jornalismo numa profissão mais próxima do crime do que da digna função de informar. É verdade que, no meio do lixo de que é proprietário, estão jornais respeitáveis como o "The Wall Street Journal". Mas nunca o direito à informação foi a motivação do Charles Foster Kane da atualidade.
No Reino Unido, os seus tablóides fizeram o que quiseram sem que nunca ninguém lhes tivesse posto um travão. Nos Estados Unidos, a sua Fox dedicou-se à mais desbragada das propagandas, silenciando, humilhando e denegrindo todos os que se opunham à agenda neoconservadora. Duas coisas definem o comportamento deste empresário: falta de escrúpulos e promiscuidade com o poder político, seja o de Bush, o de Thatcher ou o de Blair. Rupert Murdoch sempre usou os seus jornais e televisões para ter poder e o poder para fazer dinheiro.
O único problema de gente como Rupert Murdoch é que a falta de limites acaba quase sempre por os fazer escorregar na sua própria lama. Só se espanta com a sórdida novela do "News of the World" quem não se apercebeu da ténue fronteira que separava o comportamento de muitos dos profissionais que trabalhavam para o magnata e o crime.
A ideia de que o jornalismo deve dar às pessoas tudo o que as pessoas querem, tratando a informação como mera mercadoria, tinha de acabar onde acaba sempre a mercantilização de tudo: na criminalidade comum. Mas convenhamos que o Rupert Murdoch e os seus capatazes não inventaram a pólvora. Se os jornais que publicam têm compradores e leitores é porque não falta quem não se choque com o esgoto que produzem. Se quem escreve não tem limites é porque quem lê não os exige.
No Reino Unido, a investigação parece não poupar ninguém e até o senhor Murdoch teve de ir a uma comissão parlamentar de inquérito para dar explicações. E isto é a parte fascinante da cultura anglo-saxónica. Nada é sagrado. Nem a privacidade dos familiares das vítimas de um atentado terrorista, nem a pose intocável dos poderosos.
Se em Portugal não assistimos à devassa da vida privada que é tão comum no Reino Unido, também nunca alguém do calibre de Rupert Murdoch seria apertado por deputados no Parlamento. Se ingleses e americanos não hesitam em espiolhar a vida de todos para que a turba julgue os pecadilhos privados das figuras públicas, também são capazes de ser severos com os poderosos.
Se nós respeitamos, regra geral, a vida privada dos cidadãos, também temos, como disse um Presidente satisfeito, "uma imprensa muito suave" com o poder. A contenção e a reverência podem, muitas vezes, ser primas direitas. Assim como a coragem e a ausência de limites. Como conseguir uma sem a outra? Não sei. É ir tentando.


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