FRANCISCO ASSIS
Francisco Assis, É preciso restabelecer o primado da política [hoje no Público]:
‘A segunda questão é igualmente relevante - estes países preparam-se para acolher Governos de perfil tecnocrático, dirigidos por personalidades de inegável competência económica, mas desprovidas de percurso político. Por detrás destas soluções perpassa a ideia de que perante a crise haverá que apelar a uma racionalidade técnico-científica doutrinariamente incolor e politicamente neutra. Um Governo, ainda que efémero, de unidade nacional, ou um gabinete constituído preferencialmente por personalidades técnicas apontam para o esvaziamento da política institucional enquanto lugar do confronto, da divergência e do debate. A neutralização da instância política torna as escolhas inúteis e reduz a cidadania a um estado menor em que a própria participação nos actos eleitorais adquire um estatuto de simples registo notarial destituído de grande interesse. Isso conduz fatalmente a um estado de anomia institucional com consequências devastadoras para a vida democrática. Abre, desde logo, as portas a manifestações de contestação de natureza extraparlamentar. Se as pessoas forem levadas a pensar que os Governos e os Parlamentos se limitam a reproduzir e satisfazer as exigências dos mercados financeiros e das grandes potências centrais, serão levados a transferir o palco da disputa política para as ruas, proporcionando a afirmação de grupos e discursos radicais, que se esgotam na pura contestação. A razão crítica perderá perante a emoção apelativa, o projecto sucumbirá diante do protesto. O vazio da política nas suas expressões institucionais deixar-nos-á entregues ao confronto entre os mercados e os diktat das grandes potências, por um lado, e a irracionalidade cega mas genuína das ruas, do outro.’
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