27 maio 2010

CAPITALISMO AUTOFÁGICO?

Muitos acreditam que a ciência descobriu que a "lei da selva" é a lei do mais forte, a lei da competição e da luta pela sobrevivência. Mais ainda, pensam que Darwin descobriu essa lei a partir de rigorosos estudos da natureza. Os incomensuráveis avanços na investigação científica no último século têm revelado, contudo, que a verdadeira "lei da selva" é a integração holística dos sistemas vivos e que todos os organismos supostamente em competição constituem, na verdade, partes interagentes de um sistema complexo numa perfeita sintonia que já dura cerca de 4 biliões de anos. Quem estuda a ciência de maneira rigorosa sabe que a estabilidade de uma célula e de organismos multicelulares depende da integração sistémica das suas partes. O mesmo acontece com os ecossistemas e o ciclo vital que sustenta o planeta, do qual fazem parte inclusive os minerais. Uma guerra de todos contra todos resultaria exactamente no contrário da estabilidade: a desintegração dos sistemas e a desestruturação da complexidade, sustentáculos do fenómeno a que chamamos vida. A "selva" é um ambiente de equilíbrio e integração, que envolve desde micro-organismos invisíveis, como bactérias e vírus, até grandes mamíferos e plantas. As leis não são escritas e não há sistema penal, mas há uma punição máxima para aqueles que desrespeitam a regra do equilíbrio: a perda de sintonia com o ambiente e, consequentemente, a extinção.O sistema capitalista teve sua origem no que Marx chamou de "acumulação originária", caracterizado pelo comércio competitivo, expropriação arbitrária e violenta de pequenas propriedades, escravidão e pilhagem de recursos de continentes invadidos e colonizados. Na Inglaterra, que teve especial destaque na alavanca desse sistema, surgiram diversas teorias justificando esse tipo de atividade predatória.No auge do imperialismo britânico do século XIX, Malthus defendeu que a vida em sociedade era uma luta pela sobrevivência, dada a escassez de recursos em relação ao crescimento populacional. Spencer, em consonância com Malthus, pontificou que os vencedores dessa luta eram os mais aptos, que superavam, pelas suas qualidades intrínsecas, as raças, classes e indivíduos inferiores e menos competentes. Se as pessoas que celebram o bicentenário de Darwin se dessem ao trabalho de ler "A Origem das Espécies" veriam que o autor dá o crédito aos seus mestres e diz que sua ideia "é a ideia do sr. Malthus aplicada à totalidade dos reinos animal e vegetal". Spencer é citado cinco vezes na tão celebrada e pouco estudada obra.A partir daí as nossas mentes foram treinadas a ver a competição do leão (predador) com as zebras ou gnus (presas), mas não para se atentar para o facto de que ambos, predador e presa, convivem a milhões de anos no mesmo espaço, em situação de equilíbrio harmónico, sem consequências ecológicas negativas. Aceitamos ideias como "egoísmo" de genes, sem nos perguntarmos como tal sentimento humano pode ser propriedade de um pedaço de matéria que nem sequer está viva – os genes são apenas moléculas que só possuem função numa célula e em interação com outras centenas de moléculas. Portanto, o capitalismo não é selvagem. É o oposto do que ocorre na natureza, uma violação da regra básica do equilíbrio, integração e cooperação que vigora no mundo natural. Por isso a sua manutenção nos está a conduzir à pena máxima aplicada aos que não seguem a verdadeira lei da selva: a extinção

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