10 agosto 2011

No início dos anos 70 do século passado - há 40 anos - o mundo vivia no fio da navalha. O império soviético estendia-se até Berlim, onde construíra um muro de separação, e disputava palmo a palmo a hegemonia mundial, ideológica, económica e militar, com os seus rivais americanos. O confronto nuclear entre os dois impérios era, então, uma ameaça permanente, enquanto os serviços secretos da CIA e do KGB espalhados por todo o mundo iam fazendo o trabalho de casa. Nessa altura, a Europa ganhava pujança económica e força política estratégica renascendo das cinzas da Segunda Guerra Mundial como um modelo social alternativo, a meio caminho entre o estatismo soviético e o liberalismo americano, assente principalmente no peso político e nas receitas ideológicas da social-democracia europeia. A Europa democrática lavara-se das suas devassas colonialistas e imperialistas e assumira-se como paladina da democracia, da solidariedade, e do Estado promotor do bem- -estar social. Homens como Willy Brandt, Olof Palme, Helmut Schmidt, Jacques Delors, Mitterrand ou Mário Soares, entre outros, protagonizaram este projecto europeu. Na mesma altura, os comunistas chineses, depois da cisão com os comunistas soviéticos, preparavam a China, ainda uma carta fora do baralho, para dar os primeiros passos num caminho de autonomia que a iria conduzir ao que é hoje uma das maiores potências mundiais. Neste tempo, tão longínquo que quase se perdeu nos confins da memória, mas tão próximo para ter sido ainda vivido pela minha geração, o modelo da Europa democrática concentrava, em si, a esperança no futuro, enquanto americanos e russos desbaratavam os seus créditos na guerra do Vietname ou na invasão da Checoslováquia.

Hoje, quatro décadas depois - tempo irrisório no processo histórico -, o todo poderoso império soviético faz parte do património arqueológico da humanidade, tendo desaparecido há duas décadas; o império americano está entre a bancarrota e os seus pergaminhos imperiais e a Europa, entretanto feita União Europeia, está a meia dúzia de passos da implosão. A China, essa, debaixo de uma feroz ditadura, caminha discretamente para se constituir a maior potência mundial. O mundo mudou muito em pouco tempo. E a social-democracia europeia também. Sobretudo a partir da deriva de Tony Blair que arrastou a social-democracia europeia para o pântano. Não se vislumbra no horizonte um regresso dos sociais-democratas europeus ao essencial, corrigindo os erros cometidos: propor soluções para a saída desta crise profunda na Europa, envolver os cidadãos nos adiais políticos e sociais do estado social, num regresso a padrões compatíveis com a riqueza efectivamente produzida, exigir justiça na distribuição dessa mesma riqueza. Numa palavra: pôr a política no posto de comando, dirigir a economia e afrontar esse papão dos mercados. A social-democracia europeia, enquanto corrente de pensamento político, não existe, quando é indispensável à reviravolta ainda possível. Andam todos, desde Geórgios Papandréu a Martine Aubry, passando Rubalcaba , a reboque dos mercados da dívida soberana, dos acordos com troikas ou das agências de rating. É triste, mas é verdade.

P.S. - O governo decidiu criar um site onde divulga as nomeações para os gabinetes ministeriais, indicando o nome, o vencimento e o cargo que desempenha. É de aplaudir, naturalmente. A transparência é indispensável à qualidade da democracia. No entanto, não se pode ficar por aqui. É necessário aplicar também o mesmo critério a todas as empresas públicas. E desafiar todos os presidentes de câmaras municipais e governos regionais a seguir o exemplo, mesmo sabendo que se corre o risco, num país de invejosos e coscuvilheiros, de se desvirtuar o objectivo principal da divulgação. O dinheiro do Estado é dinheiro dos cidadãos, dos contribuintes.

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