13 abril 2011

PORTUGAL AJOELHOU

PORTUGAL AJOELHOU«É triste dizê-lo. Mas as coisas são o que são. Não vale a pena esconder a realidade. A verdade vem sempre ao de cima, cedo ou tarde. Portugal estava a viver, há muito tempo, acima dos seus recursos. O excessivo despesismo do Estado e das famílias, o endividamento, público e privado, o espectro de falências sucessivas e do desemprego crescente, conjugado com a avidez dos mercados especulativos e a pressão das agências de rating, ao serviço dos mesmos especuladores - que poucos ousam contestar -, conduziram-nos à beira do colapso: seria a bancarrota ou o pedido de auxílio ao FEEF (Fundo Europeu de Estabilidade Financeira) e ao FMI (Fundo Monetário Internacional).
Foi na quarta-feira passada, 6 de Abril, que José Sócrates e o Governo demissionário foram forçados, pelas circunstâncias, não havia outra alternativa, a dirigir a carta formal de pedido de apoio às instituições monetárias europeias e internacionais. Podia tê-lo feito antes e com menos dramatismo? Provavelmente. Mas um conjunto de circunstâncias adversas, políticas e económicas, em que as culpas estão repartidas, como a história o dirá, precipitou as coisas. A seu tempo, com isenção e transparência, saberemos como tudo se passou.
Agora, entrámos numa nova fase, que devemos saber negociar, com inteligência e bom senso, procurando defender do aperto terrível que aí vem - como foi prometido, prioritariamente - os mais pobres, os desempregados, os idosos que recebem pensões de miséria e os jovens da "geração à rasca", abrindo-lhes alguns horizontes. Para isso é preciso que os três pilares sociais, proclamados por Sócrates, não sejam atingidos, nos pontos principais, pelos cortes da austeridade exigidos: o Serviço Nacional de Saúde, a educação pública e a segurança e a dignidade de quem trabalha. Será possível realizar tal objectivo estando Portugal a entrar - como está - em recessão? Tenho as minhas dúvidas. Mas oxalá me engane.
O certo é que Portugal entrou no grupo das vítimas dos mercados especulativos: Grécia, Irlanda e agora, Portugal. Sem protestos sérios, até agora, contra a suicidária política europeia. Estamos, aliás, em boa companhia, porque tanto a Grécia como a Irlanda são grandes nações europeias, que muito deram, no plano histórico e cultural, à Europa, e esta muito lhes deve. A partir de agora era bom que nos pudéssemos entender, os três Estados, para o que der e vier...
A Islândia - que não faz parte ainda da União, mas pretende entrar - realizou, no domingo último, um referendo perguntando aos islandeses se estavam dispostos a pagar ou não à Holanda e ao Reino Unido, Estados que lhes tinham emprestado dinheiro, por causa da crise. A resposta popular foi não, pela segunda vez. Atenção: é uma opção que pode ser contagiosa para Estados membros da União, em idêntica situação...
Mas a verdade é que a questão, antes de ser nacional, é europeia. A subserviência da União face aos mercados especulativos está a tornar-se cada dia mais contestada e impopular. Cada vez vai ser mais difícil de aceitar. Ora, se a União não muda de paradigma, é ela própria que entra em colapso. Os Estados que se seguem, apesar dos protestos em contrário dos respectivos líderes, são: a Bélgica, a Espanha, a Itália e talvez, com alguma probabilidade, a própria França. Quer dizer: a União Europeia aceitando, sem discussão - passivamente -, o domínio dos mercados sobre a política, ao serviço dos especuladores, quase todos americanos, sem regras éticas nem valores, está a contribuir inexoravelmente para a sua própria decadência e talvez mesmo desagregação. É que, reconheça-se: são alguns dos protagonistas, responsáveis pela crise global que começou nos Estados Unidos, que continuam a alimentar, na Europa, a crise e a beneficiar dos grandes lucros que ela lhes trouxe e traz, numa total impunidade.
Vivemos num mundo cão, com grande  menosprezo pelos mais fracos.
 Por todo o lado encontramos a mesma ganância, a agravar as desigualdades, o desrespeito pelos direitos humanos, o mal-estar social e a difícil governabilidade dos Estados nacionais. A União Europeia está, paulatinamente, a deixar de ser um exemplo, neste nosso mundo tão complexo, a perder todo o antigo crédito e o seu prestígio na cena internacional. Os líderes que dirigem a União deixaram de obedecer aos valores e aos objectivos do projecto europeu e estão a arrastar a actual União, necessariamente, para a desagregação. São líderes que se fotografam tão sorridentes nas cimeiras mas não ficarão nahistória, ou se ficarem será com péssimos retratos.
populações europeias, dos diferentes Estados membros, cada vez se tornam mais críticas dos seus dirigentes. Não aceitam que se percam os valores da solidariedade e o idealismo humanista que sempre norteou o projecto europeu. Não toleram uma Europa dividida entre pobres, a roçar a miséria, e ricos, cada vez com mais  fortunas multimilionárias, antes impensáveis e escandalosas. Tudo aponta, assim, para que caminhemos para graves rupturas, precedidas de revoltas que cada vez mais serão violentas. A União Europeia também começa a aproximar-se do abismo, sem que os seus dirigentes se queiram aperceber desse perigo tremendo.» [DN]
Publicado por O Jumento

Sem comentários: