16 abril 2011

A SURPRESA NA CIMEIRA DE BRUXELAS


Imagino a surpresa na cimeira de Bruxelas: pela primeira vez em 25 anos, a República Portuguesa não faz figura de aluno bem-comportado mesmo com más notas. Só por si, esta novidade deveria ser suficiente para alertar os poderes europeus de que algo vai mal no seu reino. Quando até em Portugal já não se teme abrir uma crise política no Parlamento nas vésperas de mais um Conselho Europeu ‘decisivo’ para os destinos do continente é porque a influência da UE desceu significativamente no ordenamento político dos Estados membros. No entanto, não será esse o alarme escutado em Bruxelas e nas outras capitais mas sim aquele outro som trazido pelas agências noticiosas: Portugal ocupou o centro dos debates na cimeira que terminou ontem. O que nem sequer seria forçosamente negativo, não fora a crise de refinanciamento do sistema financeiro português.
Acontece que, contrariamente ao que sucedeu em 1978 e 1983, muitos responsáveis nacionais resistem ao recurso à ajuda do FMI e preferem acreditar que o "fundo de resgate", ou o "fundo de estabilização" ad-hoc europeu, acabará por ser o melhor remédio para os males financeiros pátrios. É verdade que os bancos não estavam privatizados nas duas ocasiões aqui referidas e que agora a entrada do FMI pode trazer obrigações e dificuldades ao sistema bancário existente, que preferiria não provar do cálice que deram a beber à banca pública naquelas emergências ocorridas antes da entrada na CEE.
Aliás, o governo de José Sócrates conseguiu nos últimos meses ganhar tempo para tentar aproveitar das eventuais lições que os responsáveis europeus e internacionais pudessem colher dos maus resultados averbados pela aplicação das receitas conjuntas do FMI e do FEE nos casos da Grécia e da Irlanda, o que tenho por valioso. Como aqui já escrevi, a narrativa da constituição de um fundo de resgate europeu robusto que ainda não tem nome, nem tesouro, nem sede – e bem podia ser administrado pelo BCE –, nem regras fixadas, é ainda uma pura virtualidade que não passou a acto nesta cimeira, contrariamente às expectativas de muitos, e possivelmente do actual governo português. Só assim se explica que tenha jogado tudo nas vésperas desta cimeira. Não é só a crise das dívidas soberanas que tem uma dimensão internacional.A crise política portuguesa também se insere num crescente mal-estar europeu. Mas tal não nos deve afastar das nossas responsabilidades.MedeirosFerreira  

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