04 julho 2011

COMO É QUE AS IDEIAS QUE GERARAM A CRISE NOS PODEM TIRAR DELA????

                                              
                                                 

Miguel Sousa Tavares, DE ONTEM PARA HOJE [ noExpresso]:
‘Comecemos pelos factos, antes das intenções: há três meses, toda a oposição, incluindo a direita, chumbou o PEC 4 de José Sócrates com o argumento de que não havia crise internacional nem crise financeira do Estado português que justificassem mais um catálogo de sacrifícios: havia apenas má governação, diziam eles E, portanto, a solução era simples e entrava pelos olhos dentro: apear o governo de Sócrates. De então para cá, os juros da dívida soberana portuguesa subiram 60% nos mercados; o governo demitiu-se, como tinha dito que faria se o PEC 4 não fosse aprovado; abriu-se uma crise política e fomos para eleições, entrando num período de letargia governativa na pior altura; em consequência e perante a reacção dos mercados, foi preciso recorrer ao auxilio externo e acatar o programa de medidas da troika bem mais gravoso do que o PEC 4, mas aceite pelo governo e, quase entusiasticamente, pela oposição de direita que recusara o PEC 4; fomos depois a votos e mudámos de maioria e de governo; e, apresentado o programa do novo Governo, constatamos que ele vai, orgulhosamente, ainda além e mais depressa do que o programa da troika e incomparavelmente mais além do que as medidas do PEC 4, cuja invocada violência justificou o derrube do anterior governo. Longe parece o tempo (há um ano) em que Pedro Passos Coelho pedia desculpas públicas por quebrar a sua promessa programática de não subir impostos, aceitando viabilizar o PEC 3. Hoje, o seu programa de Governo é, antes de mais qualquer coisa, um ataque em massa aos contribuintes. Longe vai o tempo que Paulo Portas garantia que as políticas de Sócrates só conduziriam à recessão: agora, é o novo ministro das Finanças a anunciar, tranquilamente, nove trimestres de recessão seguidos. (…) Estes são os factos, vejamos agora as intenções. Como já foi dito, o programa do Governo de Passos Coelho tem uma virtude prévia: é coerente com as ideias ultraliberais de direita que ele foi expondo aos longo dos últimos tempos. Nisso, não pode ter defraudado ninguém, só os desatentos. E, se bem que eu prefira mil vezes a coerência e a coragem do que a hipocrisia e a cobardia políticas, não consigo deixar de me interrogar como é que as ideias que conduziram o mundo à crise sem precedentes que vivemos servirão também para o tirar...

Sem comentários: