25 outubro 2011

CAVAQUÊS



Interpretando a clássica figura do polícia bom, Cavaco Silva fez saber que não estaria de acordo com os cortes que o governo propõe. A representação adensa-se quando Cavaco, invocando o seu superior conhecimento do país a partir das cartas que recebe em Belém, declara parecer-lhe haver entre os pensionistas quem já não tenha capacidade para participar nos “sacrifícios”. Entusiasmado, remata com o auto-elogio sobre uma alegada coerência que reclama para si.
Um recém-chegado à realidade política portuguesa não teria dúvidas em pensar que o Presidente da República se estaria a preparar para não promulgar o OE2012. Dos que cá estão, ninguém o vaticinou. Esta declaração é cavaquês. Uma espécie de dialecto esguio e inconclusivo. Um emaranhado de palavras no qual tudo pode ser subentendido e nada deve ser concretizado.
No momento em que um grupo de ultras do PSD quer avançar para a responsabilização criminal dos agentes políticos, importa dizer que, nos últimos 30 anos, não é fácil encontrar uma decisão ruinosa para o país em que não conste a assinatura de Cavaco Silva. No governo, foi quem mais fez aumentar a dívida, criou o buraco das PPP, financiou o abate da frota pesqueira e as plantações de eucaliptos ou apadrinhou figuras sinistras. Como Presidente da República, promulgou todos os orçamentos e políticas de Sócrates ou a nacionalização dos prejuízos do BPN – neste caso, de uma forma inusitadamente célere.
Acreditar que os interesses do pensionista dourado ou do especulador do BPN se cruzam com os da maioria dos pensionistas é como pensar que a raposa pode defender a galinha.
Arquitecto

Sem comentários: