19 janeiro 2012

do Desassossego, de Fernando Pessoa, Editora Assírio & Alvim.


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Os Indignados e a Ostentação da Riqueza

Na realidade, até agora parece que ninguém sabe bem (ou finge não saber) qual é a solução para esta crise económica e financeira global. O comunismo colapsou e esteve impregnado de grandes injustiças e violações de direitos humanos, com mais que relatadas perseguições aos dissidentes e outras desumanidades ignóbeis, simulando a equidade social e a sociedade justa; o socialismo deu realmente resultados onde vigorou ou onde ainda vigora, (Serviços Nacionais de Saúde, benefícios nos sistemas de ensino, os mais diversos subsídios de auxílio às situações de precariedade, etc.) mas, entre nós, foi um dos factores - entre outros bem mais graves que, estes sim, levaram o país à pré-falência. É que os encargos respectivos assumidos pelos sistemas socialistas, infelizmente, no nosso caso, acabaram por se revelar insuportáveis pela nossa débil economia e pelos recursos financeiros por ela gerados. Outro factor é igualmente o facto de os governos se revelarem sempre indisponíveis para lutarem contra os privilégios de que gozam certas classes sociais que, impunemente, colocam os seus lucros em paraísos fiscais, fugindo assim à fiscalidade interna. O socialismo introduziu de facto uma certa dose de humanismo na sociedade e na governação mas, na realidade, ele só será suportável se forem corrigidos muitos dos desperdícios e abusos praticados em muitas áreas da nossa sociedade por agentes que de humano pouco ou nada têm e apenas pensam nos seus bolsos. E é isso que se terá de fazer se se quiser optar definitivamente pelo humanismo e pelo socialismo entre nós : muito maior equidade na repartição dos recursos e nenhum abuso na definição dos vencimentos que uma grande quantidade de dirigentes aufere, tanto em empresas privadas como em empresas públicas ou semi-públicas.
O que fazer então para isso? Vai ter de mudar muita coisa a nível nacional e internacional. Vai ter de se introduzir uma transformação profunda no sistema económico e financeiro (principalmente no financeiro) obrigando os Bancos - através de impostos a isso destinados - a repartirem uma parte dos seus lucros em benefício dos menos favorecidos e dos desempregados que o sistema despudoradamente criou. Se for preciso, modificando os paradigmas e fundamentos das Constituições nacionais. Modificando profundamente o modo de pensar, estritamente capitalista, que já vem dos tempos da Idade Média, quando surgiram as primeiras e ainda primitivas instituições que começaram a praticar uma agiotagem desmesurada. Estas instituições e este sistema bancário chegaram ao fim se não modificarem as suas práticas, e estão a dar cabo de todas as sociedades humanas. Que reflictam e que aceitem agir de outro modo é preciso !! Se assim não for, criar outras instituições financeiras bem mais humanas é preciso ! Abandonar e refutar os empedernidos e egoístas modos de pensar em vigor é preciso ! Os lucros que normalmente auferem terão chegado para isso. Pôr termo à ostentação é necessário.
Eliminar ou transformar profundamente as Bolsas mundiais através das quais investem os especuladores financeiros é igualmente preciso !! Estes não contribuem em nada para a produção mundial e só introduzem factores de confusão e de inverdade na realidade económica e financeira mundial.
Igualmente necessário é aplicar pesados impostos aos rendimentos de tantos que os auferem elevadíssimos, ostentando (é o verbo adequado) essa riqueza do modo mais anticristão (no sentido genuíno, de acordo com os conceitos que foram pregados e em que se diz que as nossas sociedades ocidentais assentam), e do modo mais despudorado possível. Esses que há séculos se estão a sorrir dos carentes que. se o são, muitas vezes àqueles o devem. E reservar o resultado dessa fiscalidade directamente à prestação de serviços sociais e a outras medidas que estimulem o desenvolvimento económico e a criação de empregos. Não é função das entidades bancárias? Pois uma das suas funções pode passar a ser essa.
É realmente necessário mudar de alto a baixo o actual modo de pensar, e introduzir - e aceitar - novos conceitos até agora repudiados e até nem sequer imaginados.

Parece tudo isto utópico? Sim, de acordo com os parâmetros de pensamento actuais. Mas a situação actual não é normal e é inédita. Para que alguma estrutura do sistema se mantenha ou ainda reste, é necessário que ele admita funcionar de outro modo, menos "egocêntrico". Se assim não for, as entidades bancárias continuarão a sofrer a descapitalização por que estão a passar, reflexo da desconfiança dos depositantes e do sistema financeiro. É que se está realmente a passar por um final de ciclo que durou séculos.

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