05 fevereiro 2009

ANATOMIA DE UMA CAMPANHA DE ASSASSÍNIO POLÍTICO




2009 - Tiago Barbosa Ribeiro
1.É certo que ainda está por esclarecer inteiramente a dimensão da ofensiva em curso contra o Primeiro-Ministro e o PS, mas no essencial já percebemos a forma como as regras básicas de uma campanha desta natureza estão a ser cumpridas. E quando se fala em campanha, por mais menosprezo que isso possa gerar em alguns blogues e na opinião pública «autorizada», sintetiza-se a forma organizada e sistemática como um conjunto de notícias, factos e contra-factos são divulgados no limiar da profissionalização com o intituito de atingir politicamente o chefe do governo, independentemente do partido X, Y ou Z.

2-A principal dificuldade de qualquer defesa contra este tipo de processos de assassinato político e estou a medir bem as palavras — reside, desde logo, na impossibilidade de alguém se defender de algo de que não foi acusado. Sucede que essa impossibilidade não limita, e até cria condições ideais, para a manutenção de uma campanha de intoxicação pública com a divulgação de factos «aleatórios» que estranhamente concorrem para um enredo peculiar em que a notícia de hoje estrutura a notícia de amanhã e a notícia de depois, num continuum viral contra quem se dirige.

3-Ou seja, enumera-se um conjunto de factos cuja relação não pode ser provada, seja entre todos ou alguns deles. A selecção daqueles factos e não outros sugere ao leitor/espectador/cidadão que há efectivamente uma relação entre eles, caso contrário não estariam ali. E mais relevante do que a impossibilidade de provar uma relação entre os factos (responsabilidade de quem os enumera) é a impossibilidade de não provar uma relação entre eles (responsabilidade do receptor). Pior: qualquer tentativa de negar o que é impossível de refutar irá dar relevo ao argumento original.

4-Grosso modo, não são necessárias mais premissas para lançar uma campanha ou uma conspiração sob a espada da «verdade». O resto está inscrito em qualquer cadeia de comunicação, para mais num espaço fortemente mediatizado como é o nosso. Sucedem-se a uma velocidade vertiginosa inúmeros «factos» cuja relação não é possível de provar, mas invertendo um ónus de prova onde a não relação também pode não ser possível de provar.

5-É lamentável que alguém seja assim sujeito a uma campanha pública em que X tem de provar que não é culpado dos factos de que é acusado por Y, mesmo que esses factos sejam aleatoriamente associados numa notícia A que dará notícia B a outra notícia A e assim sucessivamente. O mesmo aconteceu noutro processo recente, utilizando até um certo blogue que seguia todas as regras para cultivar a chama de uma boa conspiração. O caso agora não envolve tantos actores, mas a mancha de óleo alastrará até que surja cansaço mediático. E, pelo caminho, como fica quem se atacou?

6-A capacidade de reproduzir e amplificar os «factos», de forma desconcentrada e fragmentada, é um dos principais alicerces desta campanha. Há dias, o Correio da Manhã fez manchete com a reforma da mãe de José Sócrates com base em informações falsas. Hoje, retractou-se da notícia: «Pelo erro, pedimos desculpa aos visados e aos leitores». Essa notícia manchou o nome de um familiar do Primeiro-Ministro e serviu para alimentar novas especulações em torno deste caso, sendo reproduzida em muitos outros jornais e centenas de blogues. A intoxicação está feita e vale por 1001 desmentidos e desculpas. Entretanto, e até ao momento, a notícia continua praticamente oculta no resto da imprensa - quantos pontos isso dará no situacionismo de JPP? - e em quase todos os blogues que têm vindo a explorar activamente esta situação. É pena.

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