26 abril 2011

UMA EXCELENTE ANÁLISE DE PACHECO PEREIRA

«[...] Por cá, também um qualquer cão toca todos os dias no Corão, dando origem a uma selva de insultos, juras, fúrias, processos de intenção a propósito de… muito pouco ou nada. Nos blogues, na maioria dos blogues políticos, este é o estilo do dia: longas polémicas com fortes palavras sobre qualquer coisa que seja parecida com o focinho do cão a tocar num livro sagrado, prefigurando quase sempre o partido ou o lado em que está arregimentado o taliban de serviço. [...]

O saber é sempre desvalorizado para que não se possam fazer comparações, e os julgamentos de carácter e os processos de intenção são o pão nosso do dia-a-dia. Um bom observador percebe que esses julgamentos de carácter são mais ilustrativos dos seus autores do que dos seus destinatários. São excelentes retratos dos próprios, feitos ao espelho nocturno da impaciência dos injustos. Não é preciso ser especialmente perspicaz, para perceber que, como nos partidos, já há gente a fazer pela vida nos blogues, com cálculo, “prestando serviços” e esperando a devida recompensa. E meia dúzia de gigantones de verbo insultuoso, pensamento curto e ânimo futebolístico lá transitam pela via da mediocridade reinante. [...]

Na verdade, eles não trazem experiência, nem mais-valia, trazem a voz grossa e grosseira do gritador de claque que se exercita nos bancos de um estádio a chamar coisa obscenas ao outro clube, com as palmadas grosseiras de aprovação do resto da claque. O alimento desta turba, especialmente excitada em período eleitoral, são as múltiplas variantes do cão que toca no Corão. [...]

Um dos casos mais evidentes foi o radicalismo inconsciente de “correr o Sócrates o mais depressa possível”, a que no PSD se deu ouvidos e cujo resultado ameaça ser ou mantê-lo, contra todas as evidências, ou dar-lhe o melhor cenário possível para um retorno ao poder a curto prazo. E o melhor cenário possível, não custa perceber, é um PSD ganhador por uma pequena margem sobre um PS que sai do seu annus horribilis sem grandes estragos. Sócrates escapará ao pior da crise, a execução do plano de austeridade do FMI passará a responsabilidade do PSD, e este estará na primeira bancada da Assembleia a conduzir uma oposição revanchista e perigosa face a um PSD muito debilitado por uma vitória que será de Pirro. [...]»

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