03 outubro 2011

ENRIQUECIMENTO ILÍCITO

 "Enriquecimento ilícito" 
Respostas de Vital Moreira a um questionário do semanário Sol sobre a criminalização do chamado "enriquecimento ilícito":

1 - As propostas do PSD e CDS, do PCP e do BE, como estão redigidas, levantam problemas de constitucionalidade, nomeadamente por inverter o princípio do ónus da prova na ilicitude?

R – As dúvidas de constitucionalidade são sérias, embora somente o Tribunal Constitucional possa oficialmente apreciá-las. Um dos princípios básicos da “constituição penal” moderna e do Estado de direito é o de que a responsabilidade penal supõe a acusação e a prova de um ilícito penal (e não uma presunção). Para efeitos penais, não há “enriquecimento ilícito” sem se provar a sua origem ilícita. Ora as formas típicas de enriquecimento ilícito (suborno, tráfico de influências, etc.) já hoje são crimes. O que se pretende agora é considerar como novo tipo de crime, independentemente de prova, todos os acréscimos patrimoniais não justificados.
Independentemente da questão da constitucionalidade, não é de aplaudir esta iniciativa. No tempo da Inquisição é que os acusados tinham de provar a sua inocência, dispensando os acusadores de provar o crime.
2 – Em caso afirmativo, o que pode ser feito no trabalho em comissão parlamentar para impedir a inconstitucionalidade dos projectos?

R – Dada a errada filosofia de partida, não vejo como é que pode dar-se a volta aos projetos de punição do “enriquecimento ilícito presumido”. Sem se provar que houve efetivamente atos ilícitos, não pode haver crime. Não há crimes presumidos.
3 – Finalmente, qual a sua opinião sobre o projecto do PS, que foi chumbado pelos restantes partidos?

Tal como propôs o PS, o que se pode considerar como crime é a falta de declaração oficial do património, quando obrigatória (titulares de cargos políticos), Mas também pode criar-se para os servidores públicos uma obrigação de indicar a fonte de qualquer acréscimo patrimonial significativo, cuja justificação pode e deve ser exigida pelo menos a todos os titulares de cargos políticos, durante o exercício do cargo e após o seu final, durante um ou dois anos. Depois, se houver incumprimento dessa obrigação, ele pode ser criminalizado e punido. Mas primeiro têm de ser criada a obrigação de justificação. Nesse caso não é o suposto enriquecimento ilícito que é crime mas sim a violação de um dever legal de justificar os acréscimos patrimoniais - o que é muito diferente.

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